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sexta-feira, 17 de junho de 2011

Teatro do absurdo: o fim da Greve docente na UESB

José Rubens Mascarenhas de Almeida*
Em Assembléia nesta manhã (17/06), no Teatro Glauber Rocha, em Vitória da Conquista, a categoria docente decidiu pela interrupção da greve docente que completava exatos 70 dias. Esvaziada de professores e com marcante presença de estudantes, a assembléia começou com uma hora e meia de atraso, sabe-se lá por quê.
Com uma pauta confusa, a coordenação da mesa mostrava-se também confusa e atropelava os pontos. No entanto, uma coisa era certa: tinha que sair dali o encerramento da greve, tal qual o Forum das AD´s decidira antecipadamente à base da categoria docente. Aliás, se uma coisa foi marcante nessa greve foi o atropelo, a começar por sua deflagração, quando a Adusb determinava o início da Greve para maio e a categoria a atropelou e deflagrou no início de abril.
Uma vez assinado o acordo, o Estado, muito bem representado no seio da categoria, deveria sagrar o retorno às atividades quando, paradoxalmente, ufanistas discursos apontavam “grandes vitórias” de um movimento grevista que devia recuar.
Que teatro do absurdo, que lógica maluca é essa que se deve recuar justamente quando se vence? Que técnico, em sã consciência, retiraria de campo uma equipe que estivesse ganhando? Se em greve estávamos vencendo, por qual motivo deveríamos fazer opção por negociações fora dela? E, se era possível negociar, efetivamente, com o Governo neocarlista, por que entramos em Greve, afinal?
Claro que quase ninguém compreendia tal lógica, mas o resultado teria que ser o pragmático. Houve até proposta insana que defendia a suspensão da greve, mas que os professores não deviam voltar à sala de aula. Loucura! Mas foi aprovada. Se era para não trabalhar, por que diabos se encerrar a greve?
Naquele contexto, embasbacados, alguns professores, assim como os alunos, que não entendiam aquilo. No meio desse teatro um tanto absurdo, sem qualquer dúvida, existe muito mais que a nossa vã inteligência conseguia perceber. Uma delas foi o surgimento daqueles que aproveitaram a greve para tirar férias e outros, via-se, pareciam ainda estar de pijamas. Mas foram lá para decidir a parada, pois haviam sido chamados para isso.
Discursos inflamados delatavam a truculência de um Estado ao qual estavam a serviço, acusava, lucidamente, uma colega. Tais discursos ufanos de “vitória” dispensavam o fato de que o governo sequer tinha cumprido sua obrigação de pagar o salário de maio dos professores, tal qual decidira o Judiciário. Esqueciam-se daquele governo que tanto desdenhara do movimento antes da greve, um governo que, além de fora-da-lei, estava inadimplente com a categoria docente. O Governador Jacques Wagner mostra-se um ilustre fora-da-lei, peitando o Judiciário e mostrando, na prática, que quem decide mesmo é o Executivo, jogando por terra a retórica do Estado burguês que preconiza independência entre os poderes. Mas o sindicato apontava para mais um crédito ao sindical-petismo.
Outros discursos repetiam a retórica governista da dicotomia pauta interna/pauta externa, desviando o olhar da categoria do foco da luta, apontando também para o falso antagonismo Governo/Reitoria/Sindicato. Como se mostrava ingênua a categoria docente, sem perceber a antecipação da disputa para a reitoria. A Ata assinada pelos reitores é aquela imposta pelo Governo, mas falas naquele palco apontavam para ela como um satânico instrumento que atentava contra a autonomia universitária, sendo que o “Termo de Compromisso” assinado entre o Forum das AD’s e o Governo em nada se diferia daquela, implicando na submissão (pasmem) do Estatuto do Magistério – e das conquistas históricas que representa –, a um reles acordo assinado entre sindicatos e governo. O “sujo ridicularizando o mal lavado”, diria minha mãe quando apontatávamos o defeito do outro para desviar os peculiares a nós próprios.
Não tenho dúvidas das conquistas políticas da mobilização da greve da UESB 2011: recepção da comunidade aos nossos pleitos; a refundação democrática da Assembléia Universitária, baseada na universalidade; a construção do Blog da Greve UESB 2011, com 60 mil acessos em dois meses de existência; a ocupação do espaço na mídia, principalmente no que consta "A voz da Greve"; a projeção nacional da greve, que ganhou o país e denunciou o sucateamento da educação pública pelo governo da Bahia.
Porém, se não tenho dúvidas destas conquistas da mobilização política, sou hesitante quanto aos resultados concretos das mesas de negociação. Para mim e para substancial parcela da categoria, as mesas de negociação representaram o nosso ponto fraco. O que ganhávamos nas ruas e na mídia, na organização política, perdíamos nas mesas de negociação-enrolação do governo com os sindicatos. Foi um processo em que o Forum das AD’s não soube administrar as vitórias políticas do movimento e se empenhou na defesa de um acordo esdrúxulo que fere os interesses da categoria docente, uma proposta rebaixada, muito mais rasteira que a enviada pelo próprio Governo que dizia seu algoz. O Forum das AD´s acabou por levar a categoria docente de todas as universidades estaduais baianas a aceitar tal "trato da desfarçatez", oferecendo ao governo a possibilidade de retirar direitos adquiridos na luta histórica da categoria, maculando o Estatuto do Magistério.
Nesse teatro do absurdo político que representou a fatídica Assembleia docente desse 17/06, em Vitória da Conquista, o que consagrou-se foi a subserviência ao Estado sindical-petista, por parte daqueles que o defendiam no seio da categoria. Ao final das contas, o onipresente Estado da Bahia, presente nas Reitorias das UEBA´s (vide Ata de Compromisso assinada pelo Forum dos Reitores e Governo) e no Sindicato – a proposta rebaixada enviada pelo Governo (ver o Termo de Compromisso) foi acordada pelo Forum das AD’s –, sob o olhar condescendente do ANDES/SN.
A grande derrotada nesse processo foi a autonomia universitária, consequentemente, docentes e estudantes da universidade. Se valeu a pena, foi pela luta. Valeu para repensarmos nossa forma organizativa (questionar a forma sindical); valeu para identificarmos as lideranças vinculadas a interesses alheios aos da categoria e aos da universidade pública, responsáveis por este desfecho; serviu para adquirirmos a experiência rica que só a luta permite que extraiamos do processo.
*Professor da UESB, membro do Comando de Greve.

10 comentários:

  1. Sim, uma vergonha porque mostramos a todos que não temos força de segurar uma luta. Como disse o professor Rubens, que técnico de futebol retiraria do campo um time que está ganhando?
    O Tirano governo do estado da Bahia mostrou desde o início seu caráter absolutista, não abrindo-se para negociações. Reprimiu a categoria docente de forma anti-democrática, e, sem um mínimo de vergonha-na-cara, manteve-se irredutível. Sabemos que a capacidade de luta se mostrou viva, em cada estudante que aderiu ao movimento, e resolveu dar voz ao grito silencioso que ecoava pela universidade há tempos. Mas, esta derrocada, este passo atrás, me pareceu bastante precipitado, demonstrando não só o caráter neocarlista do Governo, mas também (e infelizmente) a dominação à que está submetida a classe docente!

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  2. Acho que todos já sabemos que esse tipo contradição da ADUSB e de alguns membros da categoria docente também, só se explica porque operamos na política como quem torce por um jogo de futebol, isso é, na base do ódio ou amor. Fomos doutrinados a trabalhar no nível do bem contra o mal, sem nos darmos conta que na política o que vige são os interesses obtusos e a projeção de um futuro em que se espera que "as bases esquerdistas votantes" e a tropa de elite (Governo e seus representantes), saibam reconhecer a grandeza dos "favores" prestados ao Estado Totalitário Mercantil em detrimento daqueles do atendimento dos interesses a quem o sindicato deveria representar. Minha colega do comentário acima tem toda razão: vergonha é o nome disso.

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  3. Gente, se convençam de uma vez que "votar é abdicar" (Elissée Réclus). E pensem bem, para esse momento, e, principalmente, para os próximos que virão, se não podemos responder a tudo isso com o nosso sonoro NÃO nas eleições promovidas pelo Estado Totalitário Mercantil desde o mais alto, até a mais baixa representação desse clero pervertido e corrompido. Em outras palavras: votar nessa gente (Reitor, representação da ADUSB, Governador, Deputados Estaduais e Federais, candidatos a reitor que carregam consigo a bandeira de nossos algozes, ex-reitores silenciosos) só faz corroborar a ação de indiferença que eles praticam em prejuízo de que deveriam representar

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  4. Perfeito o pensamento apresentado pelo professor José Rubens. Às vezes fico a pensar como deve ser ridícula a encenação da comédia absurda de uma reunião na mesa de negociação, entre o Governo Sindical/Petista de um lado e do outro lado ele mesmo, representado pelo pseudo sindicato governo sindical/petista) AD(s)...

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  5. Não sei qual foi a "vitória" que o presidente do sindicato alardeaou tanto na sua fala nesse teatro ridículo. Diga-se de passagem, a primeira fala do bloco. Ai, sou aluna, defendo direito do trabalhador a greve, mas isso ai sim foi o que meus colegas desavisados repetem e que agora concordo. Na hora que o governo dá qualquer migalha (e dessa vez foi nenhuma) os professores saem da greve e nós pagamos o pato. Terminar o semestre em 15 dias? é o fim da picada....

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  6. outra coisa...a reitoria convocou o consepe para o dia 22/06, são joão praticamente, onde boa parte, se não todos estarão viajando apra aprovar um calendário já pronto, antes mesmo do fim da greve...é brincadeira?
    pra que fazer greve então, minha gente?
    concordo com flavio dantas quanto aos atores do teatro. são todos: iguais reitoria, direção da adusb e governo.

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  7. A suspensão da greve foi deliberada pela categoria, porque se esgotou as finalidades que determinaram a sua deflagração, com a celebração dos Termos de Acordo e de Compromisso, devidamente avalizadas pelas Assembléias da categoria realizadas em Jequié e Itapetinga nos dias 07 e 14/06/2011, sem que houvesse recurso de reapreciação da decisão por quem quer que seja. Vencida a matéria principal,nem a pauta interna, nem o descumprimento das decisões judiciais pelo Governo Jaques Wagner, em relação ao pagamento do salário de maio de 2011, conseguiram convencer a categoria a manter a greve por tempo indeterminado, apenas na UESB, considerando a necessidade de se manter a unidade do Movimento Docente, conquistado no Fórum das Associações Docentes, para os próximos embates que virão.
    Por outro lado, a tese pela celebração dos acordos venceu por um placar de 36 a 31 votos, se registrando a ausência e retorno antecipado de muitos defensores da tese de rejeição. Compreendendo as especificidades das rotinas cotidianas dos professores militantes, mas não posso admitir que elas determinem a condução do Movimento Docente, pois ele é dinâmico e naõ pode parar para esperar os ajustes nas agenda de alguns professores que perderam o foco e o momento de travar o bom combate.
    Por último, mesmo não superando a dicotomia que perpassa o movimento docente na UESB, avalio que os resultados obtidos foram resultantes da efetiva correlação de forças que se estabeleceu no plano interno, entre tendências que se aglutinam no Movimento Docente da UESB, e no plano externo, entre a categoria e o Governo Jaques Wagner, portanto, mesmo não tendo sido contempladas as perspectivas e expectativas originárias de incorporação da totalidade da CET sem clausula de mordaça e a revogação total ou derrogação parcial do Decreto 12583/2011, combinadas com o atendimento imediato da pauta interna, avançamos para acumular forças para os próximos embates que virão, não só em 2013, mas no próximo ano, quando haveremos de reivindicar o percentual de reposição salarial que recomponha as efetivas perdas inflacionárias, juntamente com as categorias vinculadas às áreas de saúde e segurança pública.

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  8. Destaco ainda que conseguimos arrancar nessa oportunidade a implementação imediata dos processos de progressão, promoção e mudança de regime de trabalho de 385 professores da UESB, que se encontravam represados há mais de uma ano, alguns com mais de 2 anos, sem previsão para a sua implantação em folha. Por outro lado, se as decisões judiciais favoráveis tivessemn sido implementadas antes da deliberação das Assembléias das 4 Associações Docentes, havidas na primeira semana de junho de 2011, talvez ainda estivéssemos em greve até alcançarmos a vitória pretendida, mas com a categoria vulnerável e esgotada, não conseguimos convencer a maioria presente nas Assembléias dos dias 07 e 14/06/2011 a continuar na greve e não celebrar os acordos....são os aprendizados de uma das maiores greves do Movimento Docente nos últimos 10 anos, apesar dos pesares

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  9. Para além do "teatro do absurdo" muito bem comentado pelo Binho, preocupa-me muito o desrespeito aos associados Chico e Isabel, cometidos nesta última assembleia. À fala do nosso presidente rechaçando o alinhamento da diretoria com as políticas do governo, evidência que nem o apelo à realidade feito por colegas que talvez acreditem se encontrar em algum lugar privilegiado que lhes possibilita enxergar a realidade, conseguia disfarçar, seguiu-se o apupo de parte da plenária ansiosa por enterrar, o mais rapidamente possível, o fantasma de uma greve (como se ela já não estivesse morta, antes mesmo de nascer!).
    Vamos com calma! Enterrar defunto é uma coisa, aplaudir a tentativa de calar o contraditório em uma assembleia docente, é outra.

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